Da torre de marfim ao impacto: A necessidade urgente da Índia de traduzir a pesquisa em ação e transformar vidas

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Da torre de marfim ao impacto: A necessidade urgente da Índia de traduzir a pesquisa em ação e transformar vidas

Atualmente, na Índia, a pesquisa acadêmica e as instituições de P&D de primeira linha estão repletas de subsídios, infraestrutura e talentos. Os IITs, o ICAR, os laboratórios nacionais de pesquisa e as universidades centrais produzem um fluxo constante de artigos, patentes e PhDs. No papel, isso parece uma história de sucesso em movimento.

No entanto, um grande paradoxo se destaca. Apesar de toda essa energia intelectual, muito pouco dela parece tocar a vida das pessoas. Nossos periódicos estão transbordando, mas nossos mercados não. Ainda dependemos muito da tecnologia estrangeira. As tecnologias que poderiam resolver problemas reais - desde a agricultura de precisão até diagnósticos acessíveis - muitas vezes permanecem presas e inexploradas nos silos acadêmicos de nossas instituições. Se a Índia quiser que a ciência e a tecnologia impulsionem sua economia e não apenas sua reputação, ela deve dar a máxima importância ao que acontece depois da descoberta.

O verdadeiro desafio é a tradução, ou seja, transformar a pesquisa em soluções utilizáveis que possam ser adotadas pelos setores e das quais os cidadãos possam se beneficiar. Já não basta publicar, é preciso produzir.

O panorama do financiamento: Manchetes amplas, impacto reduzido

A Índia gasta apenas cerca de 0,64% de seu PIB em pesquisa e desenvolvimento, de acordo com dados do governo para 2020-21. Esse número quase não se alterou nos últimos anos. Desse valor, quase dois terços são provenientes de fundos públicos. O setor privado - que impulsiona a maior parte da pesquisa aplicada nas economias avançadas - responde por apenas um terço.

Mais preocupante do que o número em si é o destino desse dinheiro. A maior parte do financiamento de P&D da Índia flui para instituições de elite: os IITs, o IISc, o CSIR, o DRDO, o ICAR e algumas universidades centrais. Essas instituições são as joias da coroa da ciência indiana, mas a concentração de fundos também significa que as universidades estaduais e os centros de pesquisa menores permanecem mal equipados para contribuir de forma significativa. Como resultado, a capacidade de inovação do país permanece desequilibrada e centralizada.

O vale da morte

O mal-estar mais profundo está além dos balanços patrimoniais. A Índia não tem apenas uma lacuna de financiamento; ela tem uma lacuna de tradução.

Os pesquisadores geralmente trabalham em projetos criados para publicação e não para produção. O sucesso é medido em citações, e não em protótipos ou patentes levadas ao mercado. O sistema de incentivos no meio acadêmico recompensa os artigos, não as parcerias. Assim, as ideias que poderiam ter se tornado produtos geralmente terminam suas vidas como PDFs em servidores institucionais.

Uma nota de política do NITI Aayog alertou certa vez que o ecossistema de P&D da Índia está “desvinculado dos braços comerciais da economia”. As evidências estão por toda parte. Os escritórios de transferência de tecnologia - os órgãos destinados a conectar os cientistas às empresas - existem principalmente no nome.

Mesmo quando o setor demonstra interesse, o tempo corre de forma diferente em ambos os lados. Os projetos acadêmicos são realizados em semestres e ciclos de revisão, enquanto as empresas perseguem metas trimestrais. Quando os resultados da pesquisa estiverem prontos, o mercado pode já ter mudado. Acrescente a isso o custo de testes, aprovações e aumento de escala, e muitas boas ideias simplesmente perdem o ímpeto.

Como outros acertaram

As dificuldades da Índia não são únicas. Muitos países já enfrentaram essa lacuna antes - e a corrigiram.

Na Alemanha, os Institutos Fraunhofer fazem a ponte entre o setor acadêmico e o setor industrial com sucesso notável. São centros de pesquisa orientados por missões que se concentram na ciência aplicada, realizando pesquisas por contrato para empresas. Setenta por cento de sua renda provém dessas parcerias. Seus cientistas não se limitam a publicar artigos; eles criam protótipos, registram patentes e desenvolvem em conjunto produtos que chegam ao mercado.

Os Estados Unidos deram um salto transformador em 1980 com a Lei Bayh-Dole, que permitiu que as universidades possuíssem a propriedade intelectual resultante de pesquisas financiadas pelo governo federal. O resultado foi transformador. De repente, as universidades americanas tiveram um incentivo para comercializar. Escritórios de transferência de tecnologia surgiram aos montes nos campi, e as startups ligadas a universidades tornaram-se um fenômeno nacional.

Os incentivos alinhados tornaram esses modelos bem-sucedidos. Os pesquisadores sabiam que a inovação poderia trazer reconhecimento e receita, não apenas citações. O setor confiava na academia para fornecer soluções, não apenas teorias. E o governo criou a arquitetura jurídica e financeira para que esse relacionamento florescesse.

O caminho da Índia para o futuro: Caminho triplo

Para que a Índia possa preencher sua lacuna de tradução, ela deve criar um sistema robusto que tenha como objetivo reunir pesquisadores, indústria e startups sob um único e grande guarda-chuva.

Primeiro, a academia deve se reorientar para a relevância. Nem todo cientista precisa se tornar um empresário, mas a pesquisa deve pelo menos perguntar: quem usaria isso? Os departamentos poderiam reservar parte de seu orçamento para “bolsas de desafio” que se concentrem em problemas definidos pelo setor. O sucesso da tradução - tecnologias licenciadas, produtos testados - deve contar tanto quanto as publicações em periódicos nas avaliações de carreira.

Em segundo lugar, o setor deve se aproximar dos campi. Com muita frequência, as empresas reclamam que a pesquisa acadêmica está “fora de alcance”, enquanto as universidades alegam que o setor não financia a pesquisa básica. Ambos estão certos - e ambos estão errados. As grandes empresas, as MPMEs e as associações setoriais devem criar “declarações de problemas” estruturadas para as instituições acadêmicas, oferecendo cofinanciamento e acesso a dados. Mesas-redondas regulares entre o setor e a academia podem manter as prioridades alinhadas.

Terceiro, as startups devem atuar como motores da tradução. O cenário de startups da Índia está fervilhando, mas os fundadores de tecnologia profunda ainda enfrentam uma escalada difícil - levantar financiamento inicial é difícil, e navegar pelas regulamentações pode ser ainda mais difícil. Os ‘Aceleradores Translacionais’ dedicados - focados em levar protótipos ao mercado, e não apenas em escrever planos de negócios - podem ajudar a preencher essa lacuna. Esses centros poderiam oferecer subsídios para sementes, orientação, instalações de teste e até mesmo suporte jurídico compartilhado para PI e conformidade.

As três partes se reforçam mutuamente: os pesquisadores devem pensar além da publicação, os setores devem continuar investindo além do patrocínio e as startups devem levar a inovação até a última milha.

O papel central do governo

O governo, inevitavelmente, terá que desempenhar vários papéis - o de catalisador, financiador e conector.

Já existem algumas histórias de sucesso. O Biotech Consortium India Limited (BCIL) transferiu mais de 60 tecnologias de institutos de pesquisa indianos para o mercado, desde vacinas até biofertilizantes. Mas isso continua limitado, em grande parte, às ciências da vida. O que a Índia precisa agora é de um ecossistema de tradução intersetorial - uma rede nacional de centros de transferência de tecnologia que abranja agricultura, energia, digital e ciência dos materiais.

Esses centros não devem ficar apenas dentro dos ministérios, mas funcionar com autonomia profissional, com uma equipe de especialistas em PI, finanças e marketing. As métricas de desempenho devem rastrear não apenas o número de patentes registradas, mas também o número de patentes licenciadas.

Na frente política, a recém-promulgada Fundação Nacional de Pesquisa Anusandhan (ANRF) oferece uma chance de corrigir o curso. Seu mandato para promover a pesquisa colaborativa e orientada para a missão deve ser acompanhado de um claro impulso para a comercialização e a avaliação do impacto. Da mesma forma, uma política de “caixa de patentes” mais eficaz, que ofereça incentivos fiscais às empresas que comercializam a PI indiana, poderia estimular o setor privado a participar mais ativamente.

Uma rede de institutos de tecnologia translacional (TTIs), nos moldes da Fraunhofer, pode ser a próxima grande aposta da Índia. Esses centros podem funcionar em SPVs ou ser financiados em conjunto pelo governo e por agentes privados. Seu foco principal deve ser as prioridades nacionais, como resiliência climática, saúde acessível e bens públicos digitais, levando tecnologias promissoras aos estágios de protótipo e piloto antes de licenciá-las para o setor ou transformá-las em startups.

Por que isso é importante agora

Países de todo o mundo estão se movendo em um ritmo gigantesco em direção a um futuro de tecnologia profunda - em IA, computação quântica, biotecnologia, energia verde e materiais avançados. Os países que liderarão são aqueles que conseguem transformar a pesquisa em realidade rapidamente. Sem sistemas sólidos para traduzir ideias em produtos, a Índia corre o risco de se tornar uma “fábrica de publicações” - rica em teoria, mas pobre em resultados.

Mas não se trata apenas de competição global. Traduzir a pesquisa inerentemente também significa inclusão - leva a ciência para os campos, clínicas e oficinas e para os níveis de base que mais precisam dela. Da agricultura de precisão aos kits de diagnóstico de baixo custo, dos sistemas de irrigação inteligentes à mobilidade de última geração - esses não são luxos, são linhas de vida. Quando a pesquisa sai dos laboratórios, ela cria meios de subsistência e oportunidades.

A mudança não ocorrerá da noite para o dia. O meio acadêmico indiano ainda valoriza mais a teoria do que a prática, e a maioria dos laboratórios simplesmente não tem os fundos ou a configuração para levar as ideias além do estágio de protótipo. Será preciso mais do que boas intenções: financiamento real, regras claras de propriedade e uma mentalidade que valorize o trabalho em equipe em vez do trabalho em silos. E isso não pode parar nos IITs - as universidades regionais e os laboratórios menores também devem fazer parte da história. As universidades estaduais e os institutos regionais também devem fazer parte da jornada para que a inovação seja realmente nacional.

De ‘Publicar ou Perecer’ para ‘Traduzir e Transformar’

A Índia não carece de ideias - carece de caminhos. A ponte entre a descoberta e a implantação é o que decidirá se nossa ciência ficará no papel ou mudará vidas. Cada patente, cada doutorado, cada concessão deve ter como objetivo o impacto no mundo real. Caso contrário, corremos o risco de transformar o brilhantismo em isolamento - inteligente, mas desconectado do país para o qual foi criado.

Chegou a hora de deixar de publicar ou perecer e passar a traduzir e transformar. Só então a ciência indiana realmente servirá ao seu povo, e não apenas ao seu orgulho.

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